Sem mas.

Sem mas.

30 de março de 2014

Entre estrelas

                Antigamente eu costumava controlar meus problemas. Jogava a culpa em outra pessoa e tentava viver bem. Conseguia ir longe assim. Pensava que não precisava de ajuda para seguir em frente. Acreditava que estava certo e que nunca precisaria prestar contas a um poder maior que eu.
                Não tinha consciência.
                Um dia acordei.
                Isso fez com que me sentisse duas vezes mais só. Eu vi pessoas com sua fé cega, seus punhos cerrados. Vi discursos estruturados como diamantes. Para mim, ainda pareciam frágeis como cacos de vidro.  Levantei e olhei em volta. Nunca me livrei dos meus problemas, eles sempre estiveram aqui e agora estão piores do que nunca. Me sufocam, impedem que eu grite por ajuda. Tenho tentado acreditar em um poder maior do que eu.
                Estou tentando dar uma chance a isso.
                Mas de repente as coisas mudaram. Sinto como se perdesse o rumo, piorei as situações, perdi a esperança. Vejo minhas pernas tremerem. Tenho certeza que para outros é mais simples se manter em pé, até mesmo se levantar.
                Respiro fundo, quatro vezes. Olho o céu, tento entender o que seria esse poder maior que eu. Nada. Talvez um dia. Hoje eu sei que preciso de ajuda para seguir em frente. Quem sabe o que pensarei amanhã...

                É claro que em algum lugar deve existir um jeito mais fácil, só não é o meu jeito. 

Desabafo

                Eu sou o cão que corre constantemente atrás de carros, mesmo sem saber o que fazer com eles caso os alcance. Sou aquele presente que você não gosta e busca trocar por algo melhor.
                Eu sou a úlcera que sangra a cada crise nervosa.
                Sou o tempo gasto com gente desinteressante, emprego medíocre, lugares banais. Devem a mim a expressão: “Murro em ponta de faca”. Eu sou o desastre que mata milhões e poupa um, a esperança diante de um futuro ferrado.
                Eu sou o escravo da tristeza, aspirante a merda nenhuma. O motivo do mundo dar errado, a semente de ódio que se recusa a vingar, o leite prestes a talhar.
                Sou a munição que se recusa a explodir, aquele que a consciência acusa, a voz que te impede de dormir, o frio no seu colchão quente, a unha que insiste em encravar.


                Eu sou a vida desperdiçada. 

23 de março de 2014

Não era pra ser



                O que você faria se perdesse aquela pessoa que sempre esteve com você? Esteve ali sem que fosse preciso mover uma palha. Essa pessoa que lutou incessantemente por uma chance, um momento. Criando, do nada, oportunidades.
                Se eu te disser que ela pode estar cansada?
                Que em algumas das vezes que te ligou foi pensando em dar um basta, mas depois de ouvir sua voz, caiu na real sobre como chato o futuro seria sem você. Eu sei que você quer mais. O que tratam como fuga, pode ser sua maneira de correr atrás. Sei que ele é só mais um garoto, desses que nunca pegou fundo no seu coração.
                Depois de um tempo levando pancada o couro endurece, ele sabe.
                Você pode não ter percebido que cada ação sua afeta alguém, um mundo. Tenta pisar fora da sua zona de conforto, se não for pedir muito, olhe em volta, respira fundo. Vê se consegue enxergar o mundo por outros olhos. As situações por outro ângulo. Talvez, para você, os sentimentos não signifiquem muito.
                Esquece a máxima de Antoine de Saint-Exupéry, não, você não é responsável por alguém, por algo ou situação além de você mesma. Se os sentimentos de outro não são grande coisa para você, não se sinta culpada. Algumas pessoas sofrem da síndrome de Dom Quixote. Não há muito que fazer com elas.
                Ele não fará drama, nem cena. Juro que não. Acreditaria em mim de primeira se soubesse o número de vezes que ele mordeu a própria língua só para não externar o que se passava por dentro. Não há ninguém na vida dele além de você. Nunca teve. Mesmo que para você os sentimentos não sejam lá grande coisa. Ele ainda lembra das noites em que dirigiam sem rumo, nada além dos faróis, as estrelas e o som do carro ligado.
                Talvez, algum dia, você sinta falta disso, dele.
                 É pouco provável, mas é possível.
                Mesmo que, para ele, essa coisa de sentimentos seja mais que o suficiente para continuar tentando. Por mais que suas vizinhas digam: “É só mais uma garota” e os amigos reforcem: “Não a deixe te afetar tanto. Não está na hora de você seguir em frente?”
                Às vezes ele pensa em acabar com tudo. Em diferentes momentos já concordou com eles. Pensou que estaria melhor só, que o mundo é um lugar imenso e ela talvez seja só mais uma garota. Mas, para ele, os sentimentos são mais do que um bom motivo para não desistir.

                E você, o que faria se, finalmente, depois de tantas tentativas, conseguisse perder essa pessoa?


                 

17 de março de 2014

Talvez amanhã

                Acordei bem cedo no último domingo. Tentei pressionar minha cabeça para ver se a dor diminuía.
                É bem uma tradição. Sempre que perco o sono no domingo, me levanto, coloco Stereophonics, pego uma cerveja e vou até a varanda. Não é minha banda favorita, mas me faz lembrar de coisas que perdi. Combina com manhãs dominicais.
                 Fico ali parado. Olhando o céu azul. É impressionante a proximidade das nuvens nessa cidade.              Entre um gole e uma brisa, lembro de como fui idiota e de quão humana ela é.
                A cerveja que tomei como café da manhã estava tão boa que acabei pegando outra. Aos poucos o mundo vai se levantando. O barulho do rádio no vizinho, com algum padre ou pastor confortando corações com a palavra do Senhor, ecoa até que as panelas comecem a dar sinal de vida.
                O cheiro do frango assando na padaria da esquina tempera o ar, se mistura ao feijão que cozinha em alguma casa na redondeza. O sol alcança meu rosto. Há dias que não o encontrava. É bom sentir algo quente em mim.
                Fecho os olhos. Busco o silêncio em meio ao caos.
                É nessa hora que eu vejo o rosto, os olhos, a franja nova que a deixou mais linda. O contorno das costas, os músculos do pescoço se contraindo, a veia que pulsa levemente, a coluna. O cheiro do perfume misturado à pele. O gosto da boca dormida. O som some aos poucos. A única coisa que escuto são as palavras dela, o sotaque melódico que acaricia meus ouvidos, a voz gostosa até quando me dá bronca. O jeito como desvia o olhar do que faz para focar em mim, fazendo com que eu me sinta o escolhido, aquele que vai até o final. A luz que rompe minhas pálpebras me lembra de como os raios de sol deixam os olhos dela mais claros, dos movimentos que a pupila faz se dilatando enquanto eu me aproximo.
                Tento manter a sensação que ela traz estando perto.
                É difícil ser bom. Ela faz parecer tão fácil, tão natural. Simples.
                Abro os olhos, penso no que tenho que fazer. O dever chama. Entro, fecho as cortinas e escoro a porta da varanda. Meu apartamento aos poucos volta a ficar frio. Já não ouço os vizinhos, não sinto cheiro da comida, desligo meu som, termino minha cerveja. Jogo o celular na cama, pego um livro.  


                Hoje eu não penso mais nela. Talvez amanhã. Hoje não.  

14 de março de 2014

Sabe que horas acaba?



                Já conheceu alguém incrível? Logo de cara você sabe que tem algo de especial nela, mesmo que tenha ouvido primeiro a voz, prestado atenção nos lindos olhos ou, quem sabe, na maneira como o piercing no nariz dela reflete pequenos fechos de luz, iluminando todo o rosto.
                Encontrou alguém assim, alguma vez, em toda a sua vida?
                Eu sempre fui muito travado com mulheres. Praticamente nunca dou o primeiro passo. Mas aí você conhece uma dessas pessoas. Uma, em meio a centenas de novas pessoas.Você a vê se afastar do mundo, sentar isolada em algum ponto. As mãos ameaçam transpirar, o seu coração bate incessante.
                Não há outra alternativa.
                Você tem que falar com ela. É obrigado a se aproximar, por mais que os músculos das pernas se tensionem a cada passo, a respiração se descompasse com a proximidade, a cabeça se esqueça de absolutamente tudo. Nada em mente. Nenhum assunto. Branco.
                Ela estava só.
                Agora lá está você, sentado ao lado dela. Coluna ereta, arriscando um engasgado: “Oi?”. Ela não é como as outras, a conversa flui. É constrangedor a maneira como você se coloca, mas ela ri. Gargalha baixinho para não atrapalhar aqueles que prestam atenção na palestra. Você gesticula, relaxa as costas, escorrega um pouco pela cadeira.
                No meio da conversa já se sentem íntimos a tal ponto que você se esquece que ela acabou de te conhecer. Não são todas as pessoas do mundo que aceitam que você passe o nariz no ombro delas. É uma mania irritante sua, ela tenta fechar a cara, tenta dizer não, mas acaba cedendo.
                Vocês se aproximam mais, sua timidez parece ir embora com o calor que emana do corpo dessa mulher. Você se esquece que está careca, que sua moto está sem gasolina e que o caderno novo dela não deveria ser usado para jogar pontinhos e fazer desenhos aleatórios, se esquece do auditório cheio, da palestra, da sua namorada. Naquele instante só existem vocês dois.
                Ela é especial.


                Quando conhecemos alguém incrível, é preciso fazer alguma coisa. Creio que seria o maior pecado do mundo deixá-la ir sem ter me esforçado pelo menos um pouco. 

12 de março de 2014

Ainda que eu caminhe...

                Maldito desenho que não começa. O pastor me lê alguns versículos, fala de amor, acho que é Paulo ou Coríntios. Parece coisa de casamento. Diz que o fogo sagrado será implacável, irônico como foi rápido do amor a fúria.
                Parece as mulheres da minha vida.
                Ponho a tv no mudo. Maldito desenho que não começa. Pego primeiro Lp, me sirvo uma dose farta de uísque. Lado B de Blood on the tracks. Como alguns amendoins, encaro a roupa suja. Bebo outra dose. Olho a tv e me pergunto: Como ele fala tanto sem beber água?
                A câmera capta gotas de saliva voando da boca, como um cão raivoso, prestes a espumar. Se está assim no meu aparelho, imagina em alta definição. É a única hora que se vê pessoas de verdade na tv. Quando passam pela plateia você enxerga aquela sua tia de quarto grau e o marido alcoólatra na quinta fileira.
                Outra dose.
                Terceira faixa, lado b. Dylan. Sabe?! É o hino dos corações partidos. Sigo até a varanda, penso no cigarro, corro das lembranças, evito o sofá que ela amontoava sua bagagem, não olho a cama, nem a pia da cozinha. Faço a dose durar. Desce rasgando. Cada gole é como um punho que vem cerrado garganta adentro. Busco entender, já quis aceitar. Hoje eu questiono o motivo de tanta distância, tanto gelo.
                Mas a música acaba, o desenho começa.

                Talvez seja um sinal. Quem sabe não é hora de trocar a faixa, mudar o roteiro. Só para variar um pouco. 

10 de março de 2014

Com os olhos marejados

                Quando eu chegar até ela, já vai ter se mudado. Pela sorte que tenho os vizinhos dirão: “Empacotou as coisas e mudou de madrugada, levou os gatos. Parece que não esqueceu nada” Então, eu, que já não andava sóbrio há dias, cairia de joelhos. Continuaria buscando.
                “Me desculpe, não quero incomodar. Preciso de uma informação: Tem visto essa garota?”
                É o que eu direi mostrando a foto dela, nos botecos, entre um trago e um gole, quando me perguntarem sobre, avisarei que é a mulher da minha vida, contarei sobre a noite de sábado, como ela dorme em meus braços e o jeito como beija. A vista, turva, me enganará. A encontrarei em outras, por algumas horas. Às três da manhã, porém, calçarei os tênis, rasgados de tanto caminhar, colocarei a camiseta manchada de vinho barato e amor vagabundo, sairei de porta em porta:  “Me desculpe, não quero incomodar. Preciso de uma informação: Tem visto essa garota?”
                Pode parecer loucura, mas é o que eu faria se ela fugisse. É o que faço quando ela some. Pego o telefone e disco, tento não ficar louco, tento não perder o senso, entre um trago de amor barato e um gole de bebida vagabunda. Eu ligo, converso, falo pelos cotovelos, pensando em ir para casa, querendo levá-la para casa.
                Mas se ela sumir, é isso que farei. Passarei por todos os lugares que não me são familiares e direi: “Me desculpem, não quero incomodar. Viu essa garota?”



8 de março de 2014

Solitária

                A tv ligada me diz que é verão, tudo vai passar, é normal. Meu cabelo molhado refresca o quarto, jogo a toalha na cama, me acomodo no sofá, penso na cerveja, no almoço, tento não pensar na garota do interior.
                Todo mundo comete erros, mas até que ponto eu tenho que continuar sendo punido pelos meus?
                Os sábios dirão: Você não viveu o suficiente. E quando você tiver vivido o suficiente, eles dirão: ainda não é o bastante.
                A tv me diz que vai melhorar, o dólar vai cair. A novela me promete um fim feliz, não diz nada sobre o meio. Eu pego o telefone, abaixo o som da tv, abro uma cerveja, encaro o teclado, digito os números. Não ligo. Um gole pela sede, dois pelo amor e quatro pela coragem.
                Quando ela atender, eu vou dizer: Olha, querida, você não viu o que fez? Jogou seu coração fora como se não fosse nada, como se eu não quisesse nenhuma outra além de você. Juro que ainda posso ouvir a música que tocava quando nos beijamos pela primeira vez. Você sempre esteve errada, eu nunca saí daqui. Você é quem fugiu, eu me mantenho aqui, sozinho. Estou cansado de esperar por você, por uma ligação, de sempre ter que me despedir.
                Aí eu encaro o telefone, abro outra cerveja. Penso que se a tratasse como os outros a tratam isso tudo seria diferente. Caramba, eu sempre fui tão bom em mentir e jogar. Talvez se eu disser que não ligo...

                Mas a tv me refresca a memória, me diz que vai valer a pena. Eu termino minha cerveja, fecho as cortinas e tiro um cochilo.   

7 de março de 2014

Aleluia

                Eu sou a nova cara do fracasso. É tranquilo de entender, não é como se fosse uma fórmula física que você só vai usar para passar de ano no colegial. Já superei a fase de acreditar no inatismo. O fracasso agora vem do carma.
                Pois é, por mais que você faça sua parte o carma é implacável.
                Olha, chará, eu tenho seguido as regras, depois de já ter quebrado inúmeras vezes. Garanto que estou dando o meu melhor e a situação só tem piorado. Todas as vezes que volto para casa é como se tivesse algo pelo qual eu deveria me desculpar.
                Sei que sou jovem, mas acredite essa é a nova cara do fracasso.
                Tentei me livrar dos hábitos ruins que desenvolvi durante os anos, mas sabe como é né?! Old habits die hard. Enquanto não desisto, estou aqui indo além do meu limite. 

                Pois é... O carma tem sido implacável. Finalmente. 

6 de março de 2014

Eu começo a pensar

                O que você faria se nunca tivesse me conhecido?
                Eu, sinceramente, não faço ideia. Provavelmente teria insistido em ter uma banda, não suportaria vegetarianos, teria comido alguns kg a mais de sanduíches e nunca teria voltado a beber tanto. Não seria apaixonado por charutos e é bem capaz que nunca teria mostrado as coisas que escrevi a alguém.
                Se nunca tivesse te encontrado, continuaria queimando os possíveis romances que escrevo. Ainda teria me envolvido com várias mulheres loucas, mas em busca de uma igual a você.
                É um tiro no escuro tentar responder esta pergunta, mas a única coisa que tenho por certo é que não trocaria te conhecer por nenhuma outra alternativa. É... Eu definitivamente estaria procurando por uma mulher igual a você. Quem mais me faria sanduíches vegetarianos e aceitaria meus presentes estranhos? Quem seria responsável por me inspirar simplesmente por respirar?

                É certo, ela teria que ser exatamente igual a você.

5 de março de 2014

Eu gosto quando Má (ché)ri pra mim.

                



                

                 Talvez tenha sido a convivência com Gérald. Eu não sou de arriscar palavras em uma língua assim, tão desconhecida. Pode ser por causa daqueles olhos azuis que me procuravam enquanto eu fechava o bar. Acompanhavam, tímidos,  alguns movimentos. Arrisco dizer que seja por causa da risada gostosa ao ver minha reação quando machuquei a mão, ou pela preocupação esboçada depois.
                É isso. Sempre tive uma queda por quem morde e assopra.
                Acho que já era quarta feira de cinzas e eu ainda não havia tido meu carnaval. Contudo, quem precisa de carnaval quando lhe esboçam amor ao pé do ouvido?
                Ela dizia em um português tropeçado:
                - Você pode ter mulher que quiser...
                - Je ne parle pas français, cependant je veux vous. Eu respondia em uma tentativa de francês, experimentando as poucas palavras que conhecia. 
                E aqueles grandes olhos azuis piscavam e a boca se aproximava da minha boca, sorria. O assunto tentava fluir e eu me vi em meio a um beijo. Beijos. Desses que a gente não quer que acabe nunca, mas que eventualmente acabam.

                Au revoir, ma chérie.

4 de março de 2014

Sempre o coração mais bondoso

               Querida, por favor, não chore. Pelo menos não enquanto eu estiver aqui. Isso não amolecerá meu coração, juro que não. Sim, o problema é você. Aliás você e todas as outras. Você simplesmente não é apaixonante.
                Você não tem os dois dentes da frente um pouco maior do que os outros, talvez por isso não tenha o sorriso que me faz querer te tirar para dançar e encher de beijos logo cedo. Não possui aqueles olhos que conversam mais do que a boca. Eles me repudiam e me afagam com uma facilidade tremenda, é por eles que, vez ou outra, vejo flores no cabelo dela. É o seu cheiro que não gruda no meu travesseiro. São as minhas camisas que não foram feitas para você. É essa mania de insistir em dizer que Pearl Jam é ruim.
                Eu não sei o que fiz para merece-la. Quando estamos juntos não há mundo. Eu sei que não dei motivos para estar com você. Na verdade eu não fiz nada. Sempre agi de maneira oposta, eu religuei o sinal luminoso de “Afaste-se”. Eu trago o aviso: “Mantenha distância” exposto em letras garrafais no meu peito.
                Sim, é um absurdo que os homens hoje em dia não saibam como fazer uma mulher se sentir desejada. Eu estou só, isso é perigoso. É difícil dizer não a vocês. É só que mulheres são criaturas tão encantadoras. O problema é que esse encanto acaba muito rápido.
                Ah! Se não fosse absolutamente apaixonado por ela, iria conhecer seus pais e te deixaria passar as noites, e os dias, na minha casa. Se você não fosse tão igual as outras e ela não fosse tão magnética, deitaríamos na rede para olhar as poucas estrelas que minha varanda permite. Sei que fui um pouco rude.
                Mas por favor, não chore.
                Ninguém fica bonito chorando. Você é maravilhosa, eu não sou o suficiente para você, muito menos para ela.
                Pena você não ter os costumes que me fizeram apaixonar. Foi divertido enquanto durou, é só que com ela a diversão é memorável. Talvez você não perceba agora. Eu é que sou muito melhor amigo do que cônjuge.
                O que ela tem?
                Não faço ideia. Sei que quando não acordo ao seu lado os dias ficam mais complicados de se aturar. É simples. Só a presença dela já muda o astral. Inclusive, me esqueço do quão cruel o mundo pode ser. Abaixo a guarda. Sei que algum dia vou conseguir escrever algumas rimas para ela, já aprendi a tocar violão e o próximo passo é compor a música.
                Vem a vontade de ser mais. Fazer mais. É uma pena que ela me queira tão pouco.
                No final das contas, ela tem a mim, é isso que a faz tão especial. Desculpa por quebrar seu coração. 

3 de março de 2014

Olhos ágeis



Eu desejava:
“Por favor, lua, se esqueça de ir embora”
Ela, então, bêbada
Me esticava as mãos e clamava:
“Anel!”
Por todas as vezes que, sóbrio,  a pedi em casamento.

Eu retirava sua blusa e o sutiã
Ela brigava com o equilíbrio.

Eu a vestia com minha camiseta favorita
Ela nunca foi tão fã assim de Ramones
Mas adorávamos aquela roupa.

Eu pensava:
“Olha, Lua, por favor se esqueça de se pôr”
Ela, com os olhos cerrados, dizia:
“Anel!”
Ela, com os lábios semi abertos, me pedia.
Eu dava beijos inteiros
Tirava sua calça
Os sapatos ficaram na cozinha
Arrependo de não ter lembrado da aliança dos meus pais presa na gaveta.

Ela caiu na cama
Torta, pela primeira vez.
Eu, sóbrio, a endireitei
Cobri suas pernas, dividi minha cama
Minha vida.

Ela dormiu profundamente
Eu, por fim, cochilei sem ligar para o cobertor
Pensava:

“Lua, por favor... Não vá.”

2 de março de 2014

Querida L.

                Sempre estive longe de ser feito de ouro, sei que você tem alergia a coisas baratas. Também entendo que você não faz ideia do que eu já fiz para te ver sorrindo. É que é tão raro. Foram tão poucos sorrisos sinceros.
                Sim, eles fazem a diferença no dia de alguém.
                Nunca medi esforços com relação a você. Nem medirei. É claro que existem palavras que nunca disse, acho pesadas demais. Na verdade elas me apavoram quase tanto quanto a ideia de perder você.
                Me lembro de quando fomos aquele show juntos e eu tentei segurar sua mão.
                Não dá para esquecer a maneira como você me olhou.
                A conversa na sua casa depois, como pediu para que me afastasse e te deixasse ter seu espaço, tudo aquilo dói menos do que te ver chorando. Eu sei que disse: “Tudo bem. Vai em frente. Eu tô legal. Não se preocupa” Se você me desse outra oportunidade dessas, mentiria de novo.
                Para te ver feliz eu faço qualquer coisa. Nunca parei para medir esforço ou fazer conta do que foi perdido. Acho que vale a pena.  

                Saudades, mande notícias. Infielmente seu, J.